Athanasius

 

365 TESTEMUNHOS DE HOSPITALIDADE

Irmão

Africa

Athanasius

 

O meu percurso vocacional como jovem deve ter começado com uma inclinação inicial para o sacerdócio, dado que quase todos os dias participava nos atos litúrgicos dos sacerdotes diocesanos que celebravam a Eucaristia diária e eram os meus confessores regulares na paróquia em que eu era acólito.

Eu era professor de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), e ensinava na Escola Superior de Educação da região de Maçai, na diocese de Ngong, na atual Universidade Moi. Nesse tempo, senti uma vontade especial de ser padre, em qualquer diocese. Era coordenador da juventude na diocese de Ngong e a minha mente, o meu tempo e tudo estava orientado para a Igreja e as coisas da Igreja. Mas, durante esse período, tinha a cabeça cheia de perguntas que fazia a mim mesmo sobre por que razão queria trocar o meu trabalho pelo serviço à Igreja. Não conseguia encontrar respostas propriamente certas, mas sabia que tinha um desejo que me impelia para metas mais altas que eu queria viver.

O meu primeiro encontro com os Irmãos de São João de Deus foi um milagre que aconteceu quando fui passar férias em Tigania, a minha terra natal, na diocese de Meru. A ideia de me tornar Irmão de S. João de Deus ocupou a minha mente quando me encontrei com o Ir. Innocent Phiri, zambiano, que tive o privilégio de conhecer durante as férias, na freguesia de Tigania. Para ser sincero, fiquei impressionado com a forma como ele estava vestido e a maneira como ele falou comigo. Aconteceu que nos encontrámos ao fim da missa, celebrada de manhã, na paróquia. Encontrei a mesma atmosfera quando, no mesmo dia, visitei os Irmãos, na sua Comunidade, onde me encontrei com o então superior provincial, o Ir. Patrick Nshdamze, e os outros Irmãos da Comunidade. Depois de termos partilhado alguns momentos naquele dia, o Ir. Patrick ofereceu-me uma caneta e um livro de orações, e voltei para casa, acompanhado pelo Ir. Innocent, sentindo-me muito feliz por ter encontrado o lugar ao qual sentia pertencer. A partir de então, mantive os contactos e visitei os Irmãos por um período de tempo que me ajudou a discernir a minha vocação.

Após as férias, voltei para o trabalho, mas muitas coisas iriam acontecer entre mim e os Irmãos Innocent e Patrick, por correio eletrónico e telefone. Sabia que o meu coração estava bem disposto e preparado, mas esperei durante quatro anos, para tomar uma decisão definitiva, sem nunca porém perder a esperança, graças aos encorajamentos que recebi. Nesse período, eu vivia sozinho e como a Casa de Formação, no Malawi, estava a ser restruturada, tive que esperar. Sentia-me impelido a tomar rapidamente uma decisão, porque sabia que era isso o que eu queria. Entretanto, o Ir. Raphael tinha assumido funções e ajudava-me a conhecer e a compreender a realidade dos Irmãos de São João de Deus. Com o passar do tempo, a esperança de ir para o sacerdócio tinha saído da minha cabeça. Por isso, tinha como alternativa entrar na Ordem dos Irmãos de São João de Deus ou procurar uma outra congregação. Mas os planos de Deus não eram esses: São João de Deus ainda estava à minha espera.

Continuava a rezar sempre que enviava alguma mensagem de correio eletrónico ou comunicava com os Irmãos, pedindo a Deus que se cumprisse a sua vontade; continuei a importuná-lo e a escrever mais e a chamar o Ir. Innocent quase todos os dias. A resposta às minhas preces foi um silêncio mortal e, então, senti-me obrigado a dar uma resposta definitiva: fui forçado a fazer uma aposta com Jesus, em silêncio. O caminho nunca mais pareceu longo, pois a hospitalidade dos Irmãos tinha-se revelado desde o primeiro dia e sentia-me em casa.

Em suma, eu sabia que a minha viagem tinha começado e era ali que eu pertencia, e não precisava de tomar nenhuma outra decisão. Pelo que me dizia respeito, eu tinha tomado naquele dia a decisão de O seguir como Irmão religioso. Enquanto a lógica da escolha não era clara, acreditava que as circunstâncias da minha vida pareciam apontar para essa direção. E foi então que, finalmente, recebi uma mensagem de correio a anunciar que iria receber a visita dos Irmãos na minha família – os Irmãos eram guiados pelo Ir. Ambrose Dery e pelo Ir. Albert, embora o Ir. Innocent tivesse feito muitas visitas à minha família antes.

Cheguei ao Malawi no dia 14 de junho de 2006, sozinho, sem qualquer conhecimento do lugar para onde ia. Estava para me unir  a outros três jovens, cheios de energia, do Malawi e da Zâmbia. Fui recebido pelo Ir. John Bangsi, cujo sorriso tocou profundamente o meu coração e senti mais uma vez que essa era a família a que eu pertencia numa terra estrangeira. Ao chegar à comunidade de Mzuzu, no Malawi, fui recebido pelo Ir. Aiden Clohsey e pelo Ir. John Minh. Ia começar o meu postulantado no dia 15 de agosto de 2006, iniciando assim também a realização dos meus sonhos há muito acalentados.

Desafios encontrados no caminho

As palavras do Vigário geral da minha diocese de Ngong continuavam bem presentes na minha mente, segundo ele, "a fraternidade é a confusão das vocações". Irmão religioso? Não levou muito tempo até eu perceber que muito poucos compreendiam o caminho que eu começara a percorrer. Os membros da minha família aceitaram a minha decisão e ficaram felizes ao saber que eu ia juntar-me à vida religiosa. O seu maior receio era que não conseguisse realizar o que pretendia ser… Deram-me a sua bênção e eu parti, começando uma nova viagem.

Julgava eu que os equívocos sobre a vocação do Irmão proviessem só de leigos, dado que não tinham conhecimentos básicos sobre a teologia da vida religiosa. Tudo o que eles sabem é que um Irmão religioso é uma pessoa com habilitações profissionais e técnicas e que pode fazer qualquer tipo de trabalho. Mas isso é completamente diferente na Família hospitaleira.

Postulantado

O meu postulado foi muito bem organizado e coordenado, com vários programas e formadores que nos davam aulas. Foi uma experiência muito boa, embora com os seus desafios, sendo a primeira vez para mim. Tendo em conta o meu nível de maturidade, gostei muito do programa de postulantado, apesar do apostolado que realizávamos três vezes por semana. O maior desafio consistiu na adaptação à língua local das pessoas e à nova forma de vida, que eu tinha começado a viver e que não conhecia antes.

Noviciado

Comecei o noviciado em Lomé, no Togo, por dois anos, onde tive o privilégio de frequentar o Instituto S. Paulo para prosseguir os meus estudos e realizar a minha formação religiosa. O processo de viver como Irmão religioso em verdadeira fraternidade com os meus confrades foi uma outra afirmação que se opõe à mentalidade predominante de agressividade, domínio e indestrutibilidade do sexo masculino e pode apontar para a possibilidade de união, amizade e fraternidade entre os homens, que são aspetos essenciais da intimidade, maturidade e compromisso do Cristianismo. Estes foram os maiores desafios derivados da idade, da linguagem e das barreiras culturais.

Gostei de viver estes dois anos, com um só coração e um só compromisso, orientado pelo Ir. Leon e, depois, pelo Ir. Etienne Sene. A sua orientação foi sobretudo paternal. Um dos momentos mais difíceis aconteceu quando faleceram a esposa do meu irmão e o meu saudoso pai: sabendo muito bem que não podia ir despedir-me deles, coloquei tudo sob os cuidados de Deus.

Escolasticado

Depois do noviciado, fui juntar-me aos outros Irmãos escolásticos, em Nairobi, no Quénia, para prosseguir os estudos de Espiritualidade. Aqui voltava a estar em casa, não só como estudante, mas como Irmão Hospitaleiro, tendo emitido os votos religiosos. Então, tudo tinha que mudar. O desafio que tive de enfrentar foi fazer com que as pessoas compreendessem o percurso que tinha feito e a missão que tinha escolhido livremente. Pedi a Deus que me ajudasse a enfrentar esta realidade e a ajudar as pessoas a compreenderem-me, a mim e à minha nova forma de vida. Estes desafios nunca mudaram a minha mente nem o coração, pois já estava preparado. Entrei para a Faculdade de Tangaza, para realizar a minha formação de dois anos, sob a orientação do Ir. Nicholas Nsale, entre 2009 e 2011. Esse período foi tranquilo e agradável, apenas com alguns desafios, de vez em quando. O espírito de São João de Deus e a unidade do amor fraterno continuavam a guiar-me.

Conclusão

Tudo o que sei sobre os Irmãos Hospitaleiros de São João de Deus é que eles são mais do que aquilo por que são conhecidos. Eles são muito hospitaleiros, gentis, generosos, muito compreensivos e acolhedores. Constituem uma verdadeira família, com características perfeitamente africanas. Experimentei um verdadeiro sentido de pertença a esta família no período em que vivi com eles.

Agradeço a Deus todo-poderoso e peço-Lhe que continue a derramar as suas bênçãos sobre nós, Irmãos de São João de Deus. Posso dizer que "se pudesse enumerar os atos de bondade de Deus que experimentei nesta família, seriam mais numerosos do que os grãos de areia na praia do mar".

Manifesto a minha profunda gratidão a Deus por me ter abençoado com o dom da vida, pelo dom do batismo e pela minha vocação para a Família hospitaleira. O seu amor, a sua força e o seu apoio permitem -me ver este dia e exprimir a minha humilde gratidão por me ter sustentado nesta família até hoje. 

 

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